quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Confissão Belga de 1561

Confissão Belga de 1561
(Memorando os valores da Reforma Protestante)


Olá, amigos, irmãos e leitores amados do Blog Palavra a Sério. Como membro de uma igreja histórica (presbiteriana) que confessa a fé em Cristo a partir da Reforma Protestante, eu deixo parte de um valiosíssimo arquivo que tenho em minha biblioteca pessoal: a Confissão Belga que, dentre outros documentos doutrinários importantes da Reforma Protestante (como as Institutas de Calvino, Catecismo de Westiminster, Cat. De Heidelberg, Confissão de Fé Batista de 1689, entre outras), tem uma relevância didática digna de nosso crédito (Gabriel Felipe M. Rocha)

Breve história da Confissão Belga (1561):

o primeiro dos padrões doutrinários das Igrejas Reformadas é a Confissão de Fé. É chamado normalmente de Confissão Belga, pois é originário da região sul dos Países Baixos, conhecida hoje como Bélgica. O seu principal autor, Guido de Brès, um prega- dor das Igrejas Reformadas dos Países Baixos, foi martirizado por causa da Fé no ano de 1567. Durante o Século XVI as igrejas desse país estavam sujeitas às mais terríveis perseguições por parte do governo católico-romano. De Brès preparou essa confissão no ano de 1561 para protestar contra essa cruel opressão e provar aos seus perseguidores que os adeptos da Fé Reformada não eram rebeldes, como haviam sido acusados, mas cidadãos dentro da lei que professavam a autêntica doutrina cristã, segundo as Sagradas Escrituras. No ano seguinte, um seu exemplar foi enviado ao rei Felipe II juntamente com uma petição em que os signatários declaravam estar prontos a obedecer o governo em todas as coisas legítimas, mas que estavam prontos “a oferecer as suas costas aos chicotes, suas línguas às facas, suas bocas às mordaças e o seu corpo inteiro às chamas” ao invés de negarem as verdades expressas nessa Confissão.

A confissão foi escrita em francês e encaminhada pelo autor a diversos estudiosos e teólogos, que fizeram pequenas modificações. Também conhecida como Confessio Belgicaou Confissão da Valônia, foi endereçada ao rei Filipe II na esperança de atenuar a feroz perseguição contra a Reforma. Seu objetivo foi mostrar às autoridades espanholas que os reformados não eram rebeldes, mas cristãos cumpridores da lei. Imediatamente foi traduzida para o holandês (1562) e depois para o alemão (1566).

Aqui no Blog Palavra a Sério, postaremos apenas parte da confissão a partir do artigo 16 ao artigo 23. “Eleição Eterna por Deus” até “Nossa Justiça perante Deus em Cristo”.

ARTIGO 16

ELEIÇÃO ETERNA POR DEUS

Cremos que Deus, quando o pecado do primeiro homem lançou Adão e toda a sua descendência na perdiçãol mostrou-se como Ele é, a saber: misericordioso e justo. Misericordioso, porque Ele livra e salva da perdição aqueles que Ele em seu eterno e imutável conselho2, somente pela bondade, elegeu3 em Jesus Cristo nosso Senhor4, sem levar em consideração obra alguma deles5. Justo, porque Ele deixa os demais na queda e perdição, em que eles mesmos se lançaram6.

1 Rm 3:12. 2 Jo 6:37,44; Jo 10:29: Jo 17: 2,9,12; Jo 18:9. 3 1Sm 12:22; Sl 65:4; At 13: 48; Rm 9:16; Rm 11:5; Tt 1:1. 4 Jo 15:16,19; Rm 8:29; Ef 1:4,5. 5 Ml 1:2,3; Rm 9:11-13; 2Tm 1:9; Tt 3:4,5. 6 Rm 9:19-22; 1Pe 2:8.

ARTIGO 17

O SALVADOR, PROMETIDO POR DEUS

Cremos que nosso bom Deus, vendo que o homem havia se lançado assim na morte corporal e espiritual e se havia feito totalmente miserável, foi pessoalmente em busca do homem, quando este, tremendo, fugia de sua presençal. Assim Deus mostrou sua maravilhosa sabedoria e bondade. Ele confortou o homem com a promessa de lhe dar seu Filho, que nasceria de uma mulher (Gálatas 4:4) a fim de esmagar a cabeca da serpente (Gênesis 3:15) e de tornar feliz o homem2.

1 Gn 3:9. 2 Gn 22:18; Is 7:14; Jo 1:14; Jo 5:46; Jo 7:42; At 13:32; Rm 1:2,3; Gl 3:16; 2Tm 2:8; Hb 7:14.

ARTIGO 18

A ENCARNAÇÃO DO FILHO DE DEUS

Confessamos, então, que Deus cumpriu a promessa, feita aos pais antigos pela boca dos seus santos profetasl, quando enviou ao mundo seu próprio, único e eterno Filho, no tempo determinado por Ele2. Este assumiu a forma de servo e tornou-se semelhante aos homens (Filipenses 2:7), tomando realmente a verdadeira natureza humana com todas as suas fraquezas3, mas sem o pecado4. Foi concebido no ventre da bemaventurada virgem Maria, pelo poder do Espírito Santo, sem intervenção do homem5. E não somente tomou a natureza humana quanto ao corpo, mas também a verdadeira alma humana, para que fosse um verdadeiro homem. Pois, estando perdidos tanto a alma como o corpo, Ele devia tomar ambos para salvá-los.

Por isso, confessamos (contra a heresia dos anabatistas que negam que Cristo tomou a natureza de sua mãe), que Cristo participou do sangue e da carne dos filhos de Deus (Hebreus 2:14); que Ele, "segundo a carne, veio da descendência de Davi" (Romanos 1:3); fruto do ventre de Maria (Lucas 1:42); nascido de uma mulher (Gálatas 4:4); rebento de Davi (Jeremias 33:15; Atos 2:30); renovo da raiz de Jessé (Isaías 11:1); brotado de Judá (Hebreus 7:14); descendente dos judeus, segundo a carne (Romanos 9:5); da descendência de Abraão6, tornando-se semelhante aos irmãos em tudo, mas sem pecado (Hebreus 2:16,17; 4:15).

Assim Ele é, na verdade, nosso Emanuel, isto é: Deus conosco (Mateus 1:23).

1 Gn 26:4; 2Sm 7:12-16; Sl 132:11; Lc 1:55; At 13:23. 2 Gl 4:4. 3 1Tm 2:5; 1Tm 3:16; Hb 2:14. 4 2Co 5:21; Hb 7:26; 1Pe 2:22. 5 Mt 1:18; Lc 1:35. 6 Gl 3:16.

ARTIGO 19

AS DUAS NATUREZAS DE CRISTO

Cremos que, por esta concepção, a pessoa do Filho está unida e conjugada inseparavelmente, com a natureza humana1. Não há, então, dois filhos de Deus, nem duas pessoas, mas duas naturezas, unidas numa só pessoa, mantendo cada uma delas suas características distintas. A natureza divina permaneceu não criada, sem início, nem fim de vida (Hebreus 7:3), preenchendo céu e terra2. Do mesmo modo a natureza humane não perdeu suas características, mas permaneceu criatura, tendo início, sendo uma natureza finita e mantendo tudo o que é próprio de um verdadeiro corpo3. E ainda que, por meio da sua ressurreição, Cristo tenha concedido imortalidade a sua natureza humana, Ele não transformou a realidade da mesma4, pois nossa salvação e ressurreição dependem também da realidade de seu corpo5.
Estas duas naturezas, porém, estão unidas numa só pessoa de tal maneira que nem por sua morte foram separadas. Ao morrer, Ele entregou, então, nas mãos de seu Pai um verdadeiro Espírito humano, que saiu de seu corpo6, entretanto, a natureza divina sempre continuou unida a humana, mesmo quando Ele jazia no sepulcro7. A divindade não cessou de estar nEle, assim como estava nEle quando era criança, embora, por algum tempo, não se tivesse manifestado.

Por isso, confessamos que Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro homem: verdadeiro Deus a fim de veneer a morte por seu poder; verdadeiro homem a fim de morrer por nós na fraqueza de sua carne.

1 Jo 1:14; Jo 10:30; Rm 9:5; Fp 2:6,7. 2 Mt 28:20. 3 1Tm 2:5. 4 Mt 26:11; Lc 24:39; Jo 20:25; At 1:3,11; At 3:21; Hb 2:9. 5 1Co 15:21; Fp 3:21. 6 Mt 27:50. 7 Rm 1:4.

ARTIGO 20

A JUSTIÇA E A MISERICÓRDIA DE DEUS EM CRISTO

Cremos que Deus, perfeitamente misericordioso e justo, enviou seu Filho para assumir a natureza humane em que foi cometida a desobediêncial. Nesta natureza, Ele satisfez a Deus, carregando o castigo pelos pecados, através de seu mui amargo sofrimento e morte2. Assim Deus provou sua justiça sobre seu Filho, quando carregou sobre Ele nossos pecados3 e derramou sua bondade e misericórdia sobre nós, culpados e dignos da condenação. Por amor perfeitíssimo, Ele entregou seu Filho a morte, por nós, e O ressuscitou para nossa justificação4, a fim de que, por Ele, tivéssemos a imortalidade e a vida eterna.
1 Rm 8:3. 2 Hb 2:14. 3 Rm 3:25,26; Rm 8:32. 4 Rm 4:25.

ARTIGO 21

A SATISFAÇÃO POR CRISTO

Cremos que Jesus Cristo é um eterno Sumo Sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque, o que Deus confirmou por juramentol. Perante seu Pai e para apaziguar-Lhe a ira, Ele se apresentou em nosso nome, por satisfação própria2, sacrificando-se a si mesmo e derramando seu precioso sangue, para purificação dos nossos pecados3, conforme os profetas predisseram4.
Pois, está escrito que "o castigo que nos traz a paz estava sobre " o Filho de Deus e que "pelas suas pisaduras fomos sarados"5; "como cordeiro foi levado ao matadouro"; "foi contado com os transgressores"6 (Isaías 53: 5,7,12); e como criminoso foi condenado por Pôncio Pilatos embora este o tivesse declarado inocente7. Assim, então, restituiu o que não tinha furtado (Salmo 69:4), e sofreu, "o justo pelos injustos"8 (lPedro 3:18), tanto no seu corpo como na sua alma9, de maneira que sentiu o terrível castigo que os nossos pecados mereceram. Assim "o seu suor se tornou como gotas de sangue caindo sobre a terra " (Lucas 22:44). Ele "clamou em alta voz: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?" (Mateus 27:46) e padeceu tudo para a remissão dos nossos pecados.

Por isso, dizemos, com razão, junto com Paulo que não sabemos outra coisa, "senão Jesus Cristo, e este crucificado" (1Corlntios 2:2). Consideramos "tudo como perda por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus", nosso Senhor (Filipenses 3:8). Encontramos toda consolação em seus ferimentos e não precisamos buscar ou inventar qualquer outro meio para nos reconciliarmos com Deus, "porque com uma única oferta aperfeicoou para sempre quantos estão sendo santificados,10 (Hebreus 10:14). Por isso, o anjo de Deus O chamou Jesus, quer dizer: Salvador, porque ia salver "o seu povo dos pecados deles "11 (Mateus 1:21).

1 Sl 110:4; Hb 7:15-17. 2 Rm 4:25; Rm 5: 8-9; Rm 8:32; Gl 3:13; Cl 2:14; Hb 2:9,17; Hb 9:11-15. 3 At 2:23; Fp 2:8; 1Tm 1:15; Hb 9:22; 1Pe 1:18,19; 1Jo 1:7; Ap 7:14. 4 Lc 24:25-27; Rm 3:21; 1Co 15:3. 5 1Pe 2:24. 6 Mc 15:28. 7 Jo 18:38. 8 Rm 5:6. 9 Sl 22:15. 10 Hb 7:26-28; Hb 9:24-28. 11 Lc 1:31; At 4:12.

ARTIGO 22

A JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ EM CRISTO

Cremos que, para obtermos verdadeiro conhecimento desse grande mistério, o Espírito Santo acende, em nosso coração, verdadeira fé1. Esta fé abraça Jesus Cristo com todos os seus méritos, apropria-se dEle e nada mais busca fora dEle2. Pois das duas, uma: ou não se ache em Jesus Cristo tudo o que é necessário para nossa salvação, ou tudo se acha nEle, e, então, aquele que possui Jesus Cristo pela fé, tem a salvação completa3. Dizer porém que Cristo não é suficiente, mas que, além dEle, algo mais é necessário, significaria uma blasfêmia horrível. Pois Cristo seria apenas um salvador incompleto.

Por isso, dizemos, com razão, junto com o apóstolo Paulo, que somos justificados somente pela fé, ou pela fe sem as obras4 (Romanos 3:28). Entretanto, não entendemos isto como se a própria fé nos justificasse5, mas ela é somente o instrumento com que abraçamos Cristo, nossa justiça. Mas Jesus Cristo, atribuindo-nos todos os seus méritos e tantas obras santas, que fez por nós e em nosso 1ugar, é nossa justiça6. E a fé é o instrumento que nos mantém com Ele na comunhão de todos os seus benefícios. Estes, uma vez dados a nós, são mais que suficientes para nos absolver dos pecados.

1 Jo 16:14; 1Co 2:12; Ef 1:17,18. 2 Jo 14:6; At 4:12; Gl 2:21. 3 Sl 32:1; Mt 1:21; Lc 1: 77; At 13:38,39; Rm 8:1. 4 Rm 3:19-4:8; Rm 10:4-11; Gl 2:16; Fp 3:9; Tt 3:5. 5 1Co 4:7. 6 Jr 23:6; Mt 20:28; Rm 8:33; 1Co 1:30,31; 2Co 5:21; 1Jo 4:10.

ARTIGO 23

NOSSA JUSTIÇA PERANTE DEUS EM CRISTO

Cremos que nossa verdadeira felicidade consiste no perdão dos pecados, por causa de Jesus Cristo, e que isto significa para nós a justiça perante Deusl. Assim nos ensinam Davi e Paulo, declarando: "Bem-aventurado o homem a quem Deus atribui justiça, independentemente de obras" (Romanos 4:6; Salmo 32:2). E o mesmo apóstolo diz que somos "justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus"2 (Romanos 3: 24).
Portanto, perseveramos neste fundamento, dando toda a glória a Deus3, humilhando-nos e reconhecendo que nós, homens, somos maus. Não nos vangloriamos, de nenhuma maneira, de nós mesmos ou de nossos méritos4. Somente nos apoiamos e repousamos na obediência do Cristo crucificado5. Esta obediência é nossa se cremos nEle6. Ela é suficiente para cobrir todas as nossas iniqüidades. Ela liberta nossa consciência de temor, perplexidade e espanto e, assim, nos dá ousadia de aproximarmo-nos de Deus, sem fazermos como nosso primeiro pai Adão que, tremendo, quis cobrir-se com folhas de figueira7. E, certamente, se tivéssemos que comparecer perante Deus, apoiando-nos, por pouco que fosse, em nós mesmos ou em qualquer outra criatura - ai de nós -, pereceríamos8. Por isso, cada um deve dizer com Davi: "Ó Senhor, não entres em juízo com o teu servo, porque a tua vista não há justo nenhum vivente" (Salmo 143:2).


1 1Jo 2:1. 2 2Co 5:18,19; Ef 2:8; 1Tm 2:6. 3 Sl 115:1; Ap 7:10-12. 4 1Co 4:4; Tg 2:10. 5 At 4:12; Hb 10:20. 6 Rm 4:23-25. 7 Gn 3:7; Sf 3:11; Hb 4:16; 1Jo 4:17-19. 8 Lc 16:. 15; Fp 3:4-9.


segunda-feira, 24 de novembro de 2014

O BATISMO COM O ESPÍRITO SANTO

O BATISMO COM O ESPÍRITO SANTO


CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES


A palavra “batismo”, de acordo com o dicionário Aurélio, tem por um dos significados “iniciação religiosa”. Já a palavra grega utilizada por Paulo e traduzida por “batizados” em I Coríntios 12:13, onde diz: “fomos batizados em um só Espírito”, é baptidzõ, derivada de baptõ, que significa “tornar submerso”, utilizado somente em referencia à purificação religiosa, especialmente referente à ordenança do batismo cristão.

Observando-se o contexto da maioria das vezes em que a palavra “batismo” é empregada no Novo Testamento, percebe-se que, de fato, o batismo, além de envolver rituais de submersão, imersão ou lavagem, também indica iniciação no objeto motivo do batismo, como por exemplo: iniciação no arrependimento (batismo de arrependimento – Marcos 1:4; Lucas 3:3); iniciação do juízo (batismo de fogo – Lucas 3:16-17); iniciação na morte do velho homem (batismo na morte – Romanos 6:4).

Não diferente disso, o batismo com o Espírito Santo indica também a iniciação do homem arrependido e convertido a Deus na participação do banquete espiritual oferecido por Cristo e sua inclusão no corpo de Cristo – a igreja invisível e universal de Deus.

Batismo, portanto, refere-se à iniciação do crente na graça oferecida a todos quantos Deus Pai chamar. Batismo de arrependimento ficou em João Batista e batismo de fogo virá no Juízo, contudo o batismo nas águas e o batismo com o Espírito Santo são atuais, sendo que o batismo nas águas indica a iniciação do crente na comunhão da igreja visível e o batismo com o Espírito Santo indica a iniciação do crente na comunhão da igreja invisível, no corpo de Cristo, daí Paulo dizer: “Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um corpo, que judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos temos bebido de um Espírito”. I Cor 12:13.


O ESPÍRITO SANTO DA PROMESSA


Para uma melhor compreensão do assunto, importa verificar a promessa que Deus fez, por meio dos profetas, de enviar o Espírito Santo a toda a congregação.

A promessa do envio do Espírito Santo no Antigo Testamento estava atrelada à vinda do Messias. Os judeus sabiam e entendiam isso, razão pela qual aguardavam ansiosos sua aparição.

Dentre várias passagens que confirmam tal conclusão, destacam-se:

“Eis aqui o meu servo, a quem sustenho, o meu eleito, em quem se apraz a minha alma; pus o meu espírito sobre ele; ele trará justiça aos gentios.” Isaías 42:1.

O espírito do Senhor DEUS está sobre mim; porque o SENHOR me ungiu, para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos;” Isaías 61:1

“Porque os palácios serão abandonados, a multidão da cidade cessará; e as fortificações e as torres servirão de cavernas para sempre, para alegria dos jumentos monteses, e para pasto dos rebanhos; Até que se derrame sobre nós o espírito lá do alto; então o deserto se tornará em campo fértil, e o campo fértil será reputado por um bosque.” Isaías 32:14-15.

Interessante notar que a profecia diz respeito à Israel, mas o cumprimento da promessa não foi sobre Israel, mas sim sobre a Igreja. Conforme se depreende do Novo Testamento, o cumprimento da promessa não trouxe restauração material à nação hebraica, como aparentemente traria, mas trouxe vida espiritual à Igreja de Cristo, o que prova que essas bênçãos prometidas são de natureza espiritual e, embora dirigidas ao povo hebreu, referiam-se ao Israel de Deus, que é o remanescente fiel separado por Deus pela fé no Cristo.

Ainda sobre a promessa do Seu envio, não poderia deixar de citar a mais contundente e detalhada profecia do Antigo Testamento, a de Joel, que diz:

“E há de ser que, depois derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas filhas profetizarão, os vossos velhos terão sonhos, os vossos jovens terão visões. E também sobre os servos e sobre as servas naqueles dias derramarei o meu Espírito. E mostrarei prodígios no céu, e na terra, sangue e fogo, e colunas de fumaça. O sol se converterá em trevas, e a lua em sangue, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor. E há de ser que todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo; porque no monte Sião e em Jerusalém haverá livramento, assim como disse o Senhor, e entre os sobreviventes, aqueles que o Senhor chamar.” Joel 2:28-32.

Aqui, Joel afirma que o Espírito seria derramado sobre toda a carne. Isso não significava que todos os homens receberiam o Espírito, mas sim que Ele não mais seria dado a alguns homens seletos como acontecia nos tempos do Velho Pacto. Todos os tipos de homens, de diversas etnias, culturas, de todas as partes do mundo, haveriam de receber o Espírito, sendo esse o sentido de “toda carne”.

Há de se observar que logo em seguida o profeta diz:: “e todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo”, o que aponta, mais uma vez, para o fato de que esse Espírito, que seria derramado sobre os homens de todas as partes do mundo, seria dado àqueles que invocassem o nome do Senhor.             Portanto, além de estar relacionado à vinda do Messias, o Espírito só seria dado a quem invocasse seu nome.


A VINDA DO MESSIAS


Passados alguns séculos, nos tempos de Jesus, João Batista anunciou a chegada do tão aguardado Messias, aquele que haveria de trazer consigo o batismo com o Espírito Santo:

“Eu, na verdade, batizo-vos com água, mas eis que vem aquele que é mais poderoso do que eu, do qual não sou digno de desatar a correia das alparcas; esse vos batizará com o Espírito Santo e com fogo.” Lucas 3:16.

Posteriormente, não muito tempo depois, o mesmo João Batista anuncia: “eis o Cordeiro de Deus”. Era Jesus de Nazaré. Cristo, então, inicia seu ministério e confirma o que dele fora dito pela boca dos profetas:

“Quem crê em mim, como diz a Escritura, do seu interior correrão rios de água viva” João 7:38-39

E mais:

“Todavia digo-vos a verdade, que vos convém que eu vá; porque, se eu não for, o Consolador não virá a vós; mas, quando eu for, vo-lo enviarei.” João 16:7

Surpreendentemente, Jesus avisa a seus discípulos que era necessário que ele partisse – para a destra de Deus – para que, após vencido a morte e ascendido aos céus, pudesse enviar o Espírito Consolador. Esse era o plano eterno de Deus revelado por Jesus.

Jesus explica, também, qual seria o papel concreto do Espírito Santo no mundo. Para o crente, Ele seria o Consolador – parákletos, no original grego - , que significa o auxiliador, o advogado presente, o companheiro, aquele que haveria de esclarecer a Escritura e de lembrar ao crente as palavras do Senhor, participando incisivamente no processo de santificação do salvo (João 14:17; 16:7); . O Espírito Santo também haveria de ter o papel de convencer o homem do pecado, da justiça e do juízo (João 16:8), seria, portanto, aquele que converteria o homem perdido, mediante a pregação da palavra, ao Deus Criador.


A VINDA DO ESPÍRITO SANTO


Conforme anunciado por Jesus, o Espírito Santo, não muito tempo depois da ascensão do Senhor, foi derramado sobre a congregação reunida em Jerusalém, conforme narrado por Lucas em “Atos 2:1-5”.

Era dia de Pentecostes. Estavam na cidade JUDEUS vindos de todas as partes da terra, os quais presenciaram sinais espantosos, mais precisamente, homens leigos falando em outros idiomas que não os seus originais. Um grande alvoroço toma a cidade.

Pedro, então, toma a palavra e explica aos cidadãos judeus o que havia acontecido naquele lugar:

“Mas isto é o que foi dito pelo profeta Joel: E nos últimos dias acontecerá, diz Deus, Que do meu Espírito derramarei sobre toda a carne; E os vossos filhos e as vossas filhas profetizarão, Os vossos jovens terão visões, E os vossos velhos sonharão sonhos; E também do meu Espírito derramarei sobre os meus servos e as minhas servas naqueles dias, e profetizarão; E farei aparecer prodígios em cima, no céu; E sinais em baixo na terra, Sangue, fogo e vapor de fumo. O sol se converterá em trevas, E a lua em sangue, Antes de chegar o grande e glorioso dia do Senhor; E acontecerá que todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.” Atos 2:16-21.

A explicação do apóstolo para o que estava acontecendo em Jerusalém, conforme visto acima, foi o cumprimento da profecia do profeta Joel.

De acordo com Pedro, tudo o que o profeta disse havia se cumprido naquele momento. Joel disse que, quando Deus enviasse o Espírito Santo, haveria sonhos, visões, profecias, sinais em baixo da terra, sangue, fogo, vapor e fumo; sol se convertendo em trevas e a lua em sangue. Entretanto, nada disso aconteceu em Pentecostes.

Isso confirma que os sinais descritos por Joel eram simbólicos e não literais. Esse tipo de linguagem é muito comum nos profetas quando eles queriam indicar eventos catastróficos ou magníficos que tinham grande impacto no mundo ou na sociedade em que aconteceriam.

Encontramos essas figuras de linguagem em Isaías 13:10, Isaías 24:23, Ezequiel 32:7 e Joel 2:10. A profecia de Joel, portanto, indicava que a Espírito seria derramado sobre os jovens e os velhos, os homens e as mulheres, os servos e os senhores. Seria um dia grandioso, pois, conforme atestado por Pedro, inauguraria o tempo dos “últimos dias” e, a partir dali, todo aquele que invocasse o nome do Senhor seria salvo.

Sendo assim, as afirmações de que visões e sonhos acontecem atualmente e que só podem acontecer após o batismo com o Espírito Santo, usando como base a profecia de Joel, não são verdadeiras. Assim como “sinais em baixo na terra, sangue, fogo e vapor de fumo” foram figuras simbólicas, “sonhos e visões” também o foram, sendo apenas um estilo de linguagem que descreve um grandioso evento do derramar do poder de Deus.


O BATISMO COM O ESPÍRITO SANTO: experiência dos Samaritanos, dos gentios e dos discípulos de João Batista


Além dos eventos milagrosos no dia de pentecostes narrados em Atos, houve sinais visíveis do derramamento do Espírito Santo em mais três narrativas no respectivo livro.

Dessas outras três, a primeira encontra-se em Atos 8:14-18, que narra a descida do Espírito Santo sobre os crentes de Samaria.

Na ocasião, Felipe dirige-se à Samaria e anuncia o Evangelho aos samaritanos. Muitos, diante dos sinais que Felipe realizava, aceitaram o evangelho e se entregaram a Cristo.

A igreja de Jerusalém, ao saber da notícia, envia Pedro e João para testificarem acerca da conversão dos samaritanos. Lá, os apóstolos impõem as mãos e o poder de Deus é derramado sobre eles. Os sinais foram visíveis, tanto que Simão, o feiticeiro, percebeu que algo diferente aconteceu quando os apóstolos impuseram as mãos. Não há dúvidas de que houve, naquele momento, uma manifestação parecida com a de pentecostes, o que confirmava o batismo com o Espíritos Santo por parte dos samaritanos.

A segunda narrativa encontra-se em Atos 10:44-46 e trata do batismo com o Espírito Santo dos gentios, representados por Cornélio e seu amigos.

Lucas narra que, quando Pedro orou por eles, logo começaram a falar em outras línguas, tal como aconteceu em Pentecostes. Mais uma vez, sinais aconteceram no ato do batismo, o que confirmou o recebimento do poder de Deus por parte do gentios.

A terceira e última narrativa trata dos discípulos de João Batista em Atos 19:1-7. Na ocasião, alguns homens, discípulos de João Batista, foram indagados por Paulo se haviam recebido o Espírito Santo quando creram. Eles disseram que nem sabiam de sua existência. Eles sequer haviam sido batizados em nome de Jesus.

Evidentemente, não eram crentes. Eram apenas homens arrependidos pelos seus pecados, mas que precisavam conhecer a verdade acerca do Cristo. Eram, provavelmente, tementes a Deus, mas desconhecedores da verdade do Evangelho. Paulo, então, os batizou e quando orou por eles, logo em seguida receberam o Espírito Santo e falaram em novas línguas, tal como ocorreu em Pentecostes, o que confirmou o recebimento do poder de Deus por parte do discípulos de João Batista.

Não por acaso, em todos os três eventos, além do de Pentecostes, houve o sinal das línguas estranhas no ato do batismo com o Espírito Santo. Esse sinal foi vital para que os Apóstolos entendessem que Deus havia aceitado, além do judeus, os samaritanos, os gentios e os discípulos de João Batista.

É importante lembrar que, embora hoje seja cristalina a ideia de que o Evangelho é universal, no tempo dos Apóstolos, no início da igreja, o assunto gerava discussão. Pedro teve dificuldade para compreender que os gentios, representados por Cornélio, haviam sido aceitos por Deus (Atos 10) e somente entendeu – não apenas ele, mas também os judeus convertidos - que Deus havia aceitado também os gentios pelos sinais que Deus manifestou no ato da conversão de Cornélio e seus amigos, os mesmos de Pentecostes (Atos 11:17-18).

Portanto, fica evidente que, na ocasião, os sinais foram necessários para que a igreja entendesse que Deus havia aceitado não apenas os judeus, mas também os samaritanos, os gentios e os discípulos de João Batista. Hoje não são mais necessários, pois Deus já provou que não há mais distinção de grupos ou etnias.

Jhon Stott fala com muita propriedade sobre o assunto, como se vê abaixo:

“A norma da experiência cristã, portanto, é um conjunto de quatro fatores: arrependimento, fé em Jesus, batismo na água e a dádiva do Espírito. Embora a ordem observada possa variar um pouco, as quatro são indispensáveis e são universais na iniciação cristã. A imposição apostólica de mãos, porém, juntamente com as línguas estranhas e a profecia, foram dadas especialmente em Éfeso, como em Samaria, para demonstrar de forma visível e pública que grupos específicos foram incorporados a Cristo através do Espírito; o Novo Testamento não as universaliza. Hoje, já não há samaritanos e discípulos de João Batista.”

A conclusão lógica do exposto é que a partir de Pentecostes, e dos sinais narrados em Atos referentes aos outros três eventos, as línguas estranhas, e os demais sinais miraculosos, não mais acontecem no ato do batismo com o Espírito Santo, necessariamente.


REFUTANDO A DOUTRINA PENTECOSTAL


            Em diversos momentos, Jesus reafirmou a promessa de que Ele haveria de derramar o Espírito Santo. Em João 20:22, o Senhor, entretanto, aparenta dar a seus discípulos o Espírito Santo, antes mesmo de sua ascensão. Vejamos:

E, havendo dito isto, assoprou sobre eles e disse-lhes: Recebei o Espírito Santo. João 20:22.

Pentecostais, interpretando o texto acima, afirmam que nesse ato narrado por João, Jesus selou, ou regenerou, os discípulos com o Espírito Santo, o que seria diferente do batismo, nascendo disso a doutrina do batismo com o Espírito Santo como sendo uma “segunda benção”. A primeira benção, no caso, seria o selo, que acontece no ato da conversão; a segunda benção seria o batismo.

Abaixo, transcrevo parte do estudo “O batismo no Espírito Santo”, elaborado pela Bíblia de Estudo Pentecostal:

“O batismo no Espírito Santo é uma obra distinta e à parte da regeneração, também por Ele efetuada. Assim como a obra santificadora do Espírito é distinta e completiva em relação à obra regeneradora e santificadora do Espírito. No mesmo dia em que Jesus ressuscitou, Ele assoprou sobre os seus discípulos e disse: “Recebei o Espírito Santo” (Jo 20.22), indicando que a regeneração e a nova vida estavam-lhes sendo concedidas. Depois, Ele lhes disse que também deviam ser “revestidos de poder” pelo Espírito Santo (Lc 24.49; cf. At 1.5,8). Portanto, este batismo é uma experiência subsequente à regeneração”.

Esse ensinamento, embora convidativo, não merece prosperar por quatro razões iniciais:

1 – Diferentemente do afirmado pelos pentecostais, o texto de João 20:22 não indica regeneração ou selo do Espírito Santo. O Evangelista João não fez referência a isso. Aferir que naquele ato se deu a regeneração dos discípulos é ir além do que está escrito. Paulo orienta os crentes de Corinto a que “aprendais a não ir além do que está escrito” (I Cor 4:6). Dessa forma, a análise do texto em questão requer exegese cuidadosa que não extrapole os limites dos ensinamentos entregues por Jesus e pelos profetas, devendo ser analisado em conformidade com eles e não sob inferências precipitadas.

2 - As profecias do Antigo Testamento não apontam para a ocorrência de dois atos do envio do Espírito Santo pelo Messias. O Espírito seria dado uma vez apenas, não em duas etapas.

3 - Jesus disse que só poderia enviar o Espírito Santo se Ele partisse e, como visto, Ele ainda não havia partido. Cristo, embora ressurreto, ainda estava com os discípulos.

4 - As últimas palavras de Jesus antes de sua ascensão foi justamente acerca da promessa que ainda não havia se cumprido. “E eis que sobre vós envio a promessa de meu Pai; ficai, porém, na cidade de Jerusalém, até que do alto sejais revestidos de poder”. Lucas 23:49. Em seguida, Lucas narra que Jesus foi assunto aos céus. Ora, evidentemente, o que aconteceu em João 20:22 antecedeu ao que aconteceu em Lucas 23:49, haja vista Lucas narrar as últimas palavras de Cristo. Assim sendo, em João 20 não houve cumprimento da promessa.

Se é assim, o que foi que aconteceu em João 20:22?

A melhor interpretação é que Cristo, naquele instante, reafirmou sua promessa, usando, para isso, um ato profético. Não por acaso, ele assopra sobre os discípulos, antecipando o que eles ouviriam no dia de Pentecostes (“o som de um vento impetuoso”). Não houve ali nenhum tipo de transmissão do poder de Deus, senão uma promessa de que ele seria transmitido. Essa interpretação, a meu ver, está em conformidade com todo o ensinamento de Cristo e dos profetas sobre o assunto.

Assim sendo, a distinção entre dois momentos da bênção do Espírito Santo, usando-se por base João 20:22, não merece prosperar, não apenas pelas razões acima expostas, mas também por outras que veremos adiante.
           

O MOMENTO DO BATISMO COM O ESPÍRITO SANTO


A posição adotada pelos pais da igreja e pelos reformadores em geral é a de que o batismo com o Espírito Santo acontece no ato da conversão do homem a Jesus Cristo, justamente por crerem na relação estrita entre o Espírito Santo e a Palavra de Deus.

A Bíblia, em diversas passagens, é enfática ao confirmar tal alegação:

“Nele, quando vocês ouviram e creram na palavra da verdade, o evangelho que os salvou, vocês foram selados com o Espírito Santo da promessa.” Efésios 1:13.

Observe que, mesmo que alguém queira fazer distinção entre “selo com o Espírito Santo” e “batismo com o Espírito Santo”, o fato de Paulo ter dito “você foram selado com o Espírito Santo DA PROMESSA” aponta para a promessa do derramamento do Espírito Santo constante no Velho Testamento. Assim, como não há no Antigo Testamento duas promessas, mas apenas uma, fica evidente que o que Paulo estava dizendo era que os crentes de Éfeso receberam o Espírito Santo (foram BATIZADOS) no momento em que ouviram e creram na palavra de verdade.

Continuando:

“Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um corpo, que judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos temos bebido de um Espírito” I Cor 12:13

“Não sabeis vós que sois o tempo de Deus e que o Espírito Santo de Deus habita em (TODOS) vós” I Cor 3:16.

“Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para remissão de vossos pecados; e (CADA UM DE VÓS) recebereis o dom do Espírito Santo” Atos 2:38.

Todas essas passagens reforçam a posição de que o batismo com o Espírito Santo, ou o selo, ou dom, como queira chamar, é confirmado no momento da conversão. Paulo disse aos Coríntios: “Todos foram batizados” e “O Espírito Santo de Deus habita em (TODOS) vós”. “Quem for batizado em nome de Jesus receberá o dom do Espírito Santo” - narra Lucas em Atos.

Todos esses textos só ratificam aquilo que Cristo havia dito em seu ministério, quando disse:

Quem crê em mim, como diz a Escritura, do seu interior correrão rios de água viva” João 7:38-39

Mas quem beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede. Pelo contrário, a água que eu lhe der se tornará nele uma fonte de água a jorrar para a vida eterna” João 4:14.

Cristo disse que para que os “rios de água viva” corressem no interior do homem bastaria a ele crer em seu nome. Evidentemente, os “rios de água viva” a que Jesus se referia, predito na Escritura, é o derramamento do Espírito Santo predito por Isaías como forma de torrentes de água (Isaías 44:3).

Não obstante, a bíblia orienta aos crentes a buscarem a plenitude do Espírito - ser cheios do Espírito. Ser cheio do Espírito e ser batizado com o Espírito são coisas diferentes e é nisso que os pentecostais erram.

Ser batizado é o ato inicial e isso não significa que o crente não precise buscar a plenitude. Fazendo analogia ao batismo nas águas, quando o crente passa pelas águas ele ainda está no início do processo de santificação, a qual vai se aperfeiçoando cada vez mais, mediante a graça de Deus, até ser “varão perfeito”.

Da mesma forma, o batismo com o Espírito Santo é o ato inicial. A partir daí, o crente deve buscar a plenitude mediante a oração, a santificação, a meditação na palavra de Deus, etc. A experiência dos pentecostais, nesse sentido, está mais relacionada ao enchimento do que ao o batismo com Espírito Santo.

A seguir, um pouco do que significa ser cheio do Espírito Santo.


A PLENITUDE DO ESPÍRITO


A ordem bíblica “enchei-vos do Espírito”, as vezes incompreendida, precisa ser melhor analisada no contexto bíblico para uma abrangente e eficaz aplicação na vida cristã. Afinal, o verbo “encher” está no modo imperativo, soando como sendo uma responsabilidade individual a plenitude do Espírito. Sendo isso uma responsabilidade, como então podemos ser cheios do Espírito e o que precisamos fazer para cumprir essa ordem?

Paulo escreve ao Efésios: “E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito;” Efésios 5:18.

A carta que Paulo escreve aos Efésios possui uma “irmã gêmea”: a carta aos Colossenses. Ambas foram escritas no mesmo ano, 62 d.C. e no mesmo local, Roma. São muito semelhantes em suas orientações, salvadas as devidas diferenças pelas necessidades locais, a ponto de alguns estudiosos sugerirem que foram escritas sequencialmente.

Devido a essa semelhança, analisar o assunto proposto levando em consideração ambas as cartas pode fazer toda a diferença, uma vez que Paulo da as mesmas orientações nas duas epístolas, porém com algumas diferenças esclarecedoras.

Em Efésios ele escreve: “E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito;” e a partir desse versículo o apóstolo descreve uma séria de condutas que os cristãos devem adotar no seu dia a dia, as quais evidenciam a vida cristã.

Em Colossenses, Paulo repete as mesmas condutas descritas em Efésios, porém, antes de descrevê-las, ao invés de dizer: "enchei-vos do Espírito", ele diz: A palavra de Cristo habite em vós abundantemente” Colossenses 3:16.

Em Efésios ele diz: “enchei-vos do Espírito” e na epístola gêmea, Colossenses, ele diz: “A palavra de Cristo habite em vós abundantemente”. Paulo sinaliza com isso que, para ele, estar cheio do Espírito é abundar na mensagem de Cristo. Estar cheio do Espírito não é simplesmente cair no chão, falar em línguas, orar em público ou realizar milagres, mas é viver os ensinamentos de Cristo, pondo-os em prática no dia a dia.

Portanto, quando Paulo diz: “enchei-vos do Espírito”, o que ele está dizendo, analisando a ordem de acordo com a orientação dada aos Colossenses é: cumpram a mensagem de Cristo! (“A palavra de Cristo habite em vós abundantemente”) E se perguntarmos: como cumprir a mensagem de Cristo? A resposta está nos versículos seguintes, tanto na carta aos Efésios como na aos Colossenses, que é: Falando entre vós em salmos, cantando e salmodiando ao Senhor, dando sempre graças a Deus por tudo, sujeitando-vos uns aos outros; vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos, como ao Senhor; vós, maridos, amai vossas mulheres; vós, filhos, sede obedientes a vossos pais no Senhor e vós, pais, não provoqueis à ira a vossos filhos; vós, servos, obedecei a vossos senhores e vós, senhores, fazei o mesmo para com eles.

É bom lembrar que a função do Espírito Santo não é criar novas regras, novas doutrinas ou derrubar pessoas. Antes, a função do Espírito Santo é lembrar-nos das palavras de Jesus e consolar-nos com isso, pois foi isso que Jesus disse do Espírito Santo:

“Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito.” João 14:26.

A obra do Espírito Santo, de acordo com Cristo, está estritamente atrelada à sua mensagem. O Espírito não inova, não inventa, mas lembra, exorta, convence e consola de acordo com a mensagem já trazida por Cristo e exposta na Bíblia.

Assim, estar cheio do Espírito é sempre se lembrar da mensagem de Cristo e praticá-la, seja na igreja, seja em casa, seja nas atividades seculares. De que adianta pular no Espírito e não honrar os pais? De que adianta falar em línguas e maltratar o cônjuge? De que adianta pregar com ousadia e maltratar o rebanho? De que adianta cair no Espírito e ser um profissional desonesto? “Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine.” I Coríntios 13:1.

Enfim, uma palavra de Jesus resume bem tudo o que foi dito: “Jesus respondeu, e disse-lhe: Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e viremos para ele, e faremos nele morada.” João 14:23.


UM POUCO SOBRE DONS ESPIRITUAIS


Vamos falar acerca dos dons espirituais. Por mais complexo que o tema venha a ser, uma coisa é certa: Deus não quer que sejamos ignorantes quanto a este assunto. Atualmente, existem muitos debates acerca dos dons, mais precisamente quanto à aplicabilidade e à contemporaneidade de alguns deles. Não me atreverei em debater todo o assunto aqui – até porque precisaria de mais tempo, espaço e estudo para isso -, delimitando-me a analisar apenas a extensão do rol de dons espirituais descritos na Bíblia.

Para tanto, inicio com uma simples pergunta: são apenas nove os dons do Espírito?

Em I Coríntios 12:8-11, o apóstolo Paulo destaca nove dons espirituais, quais sejam: palavra da sabedoria, palavra da ciência, fé, dons de curar, operação de maravilhas, profecia, variedade de línguas e interpretação das línguas.

O original grego da palavra “dom” em I Coríntios 12 é “charisma” ou “karisma”, cujo significado é “um dom da graça” ou “um benefício imerecido”. Não restam dúvidas que o “dons espirituais” de I Coríntios 12:8-11 fazem parte do rol dos dons concedidos pelo Espírito de Deus, a cada um como o quer, para o aperfeiçoamento do corpo, conforme ensinado no versículo 11 do mesmo capítulo.

Entretanto, analisando-se os ensinamentos apostólicos no Novo Testamento, notam-se outros róis de dons espirituais, contendo alguns dons iguais aos descritos em I Coríntios 12:8-11 e outros, porém, diferentes.

Esses róis são descritos nas seguintes passagens, que ora faço descrição:

Romanos 12: 6-8
“De modo que, tendo diferentes dons, segundo a graça que nos é dada, se é profecia, seja ela segundo a medida da fé; Se é ministério, seja em ministrar; se é ensinar, haja dedicação ao ensino; Ou o que exortar, use esse dom em exortar; o que reparte, faça-o com liberalidade; o que preside, com cuidado; o que exercita misericórdia, com alegria.”

I Coríntios 12:28
“E a uns pôs Deus na igreja, primeiramente apóstolos, em segundo lugar profetas, em terceiro doutores, depois milagres, depois dons de curar, socorros, governos, variedade de línguas”.

Efésios 4:8 e 11
“Por isso diz:Subindo ao alto, levou cativo o cativeiro,e deu dons aos homens....”
“E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores.”

I Pedro 4:10-11
“Cada um administre aos outros o dom como o recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus. Se alguém falar, fale segundo as palavras de Deus; se alguém administrar, administre segundo o poder que Deus dá; para que em tudo Deus seja glorificado por Jesus Cristo, a quem pertence a glória e poder para todo o sempre. Amém.”

Vê-se, portanto, que os apóstolos Paulo e Pedro acrescentam outros dons, dados aos crentes para edificação e crescimento da igreja - o corpo de Cristo. Como dito, alguns dos elencados nos róis acima citados coincidem com os elencados no famoso rol de I Coríntios 12:8-11, outros não. Embora esses outros dons (MINISTÉRIOS, ENSINAR, EXORTAR, REPARTIR, PRESIDIR, EXERCITAR MISERICÓRDIA, APÓSTOLOS, DOUTORES, SOCORROS, GOVERNOS, FALAR, ADMINISTRAR, EVANGELIZAR, PASTOREAR) não estejam no rol de I Coríntios 12:8-11, a esses também o Novo Testamento, no original grego, os trata como “charisma”, ou seja, um dom provindo da graça de Deus e não como “dorea” – conforme é usualmente ensinado por alguns grupos neo-pentecostais e até pentecostais-, cujo significado é “presente, favor”.

Esses grupos utilizam-se do argumento de que os dons espirituais são apenas os “nove” apresentados em I Coríntios 12:8-11 pois apenas ali são tratados como “charisma”, alegando que nos outros róis a palavra “dom” está descrita, no original grego, como “dorea”. Tentam alegar com isso que os dons mencionados na Bíblia, que não os de I Coríntios 12:8-11, são “dons naturais” e não “espirituais”.

É fato que essa argumentação não é feita de forma direta, mas indireta. Explico: os defensores dessa tese aduzem que todas as vezes que a palavra “dom” aparece isoladamente no novo testamento, se pronuncia, no original grego, dorea. A partir desse pressuposto, ocupam-se em estudar e ensinar apenas os nove dons espirituais de I Coríntios 12:8-11, como se apenas nesse rol a palavra original é charisma, ficando implícito, nessa linha de pensamento, que nos demais róis a palavra grega é “dorea” e não “charisma”.

Vejamos o engano. Três aspectos serão analisados:

- primeiro, a mentira do “dorea”: não é necessário um estudo sistematizado da Bíblia para concluir que Paulo e Pedro usam a mesma palavra charisma (dom) em todas as outras passagens em que os dons espirituais são mencionados, seja em Coríntios, seja em Romanos, seja em Efésios, seja em 1Pedro. A Bíblia de Estudo Palavra-Chave e demais escritos acerca do assunto, dentre eles o do renomado pastor, escritor e teólogo, D. A Carson (Livro A manifestação do Espírito), não deixam dúvidas de que todas as vezes em que são mencionados “dons”, nos cinco róis do novo testamento, a palavra empregada é charisma. Portanto, dons de presidir, dons de socorrer, dons de repartir, dons de administrar estão no mesmo patamar de dom de línguas, dom de palavra de sabedoria ou dons de interpretação de línguas, pois todos eles são charisma e não dorea como é erroneamente ensinado, talvez por descuido ou ignorância;

- segundo, a lógica textual: não haveria razão lógica para Paulo empregar no mesmo grupo, por exemplo, “dons de curar” e “governos”, como em 1Coríntios 12:28, se eles não fossem da mesma natureza. Ou seja, se Paulo falava de dons espirituais e no ensino ele empregou “dom de curar” e “governos”, fica claro que, assim como “dons de curar” é um dom espiritual, “governos” também o é, haja vista serem provenientes do charisma, que é a graça de Deus, e estarem sendo tratados na mesma ocasião textual. Não há, portanto, razão para diferenciá-los em “espirituais” e “naturais”, sendo todos eles dons espirituais;

- terceiro, a contradição: o dom de “profecias” é apresentado no rol da carta aos Romanos (12:6-8) e de I Coríntios (12:8-11). Ora, se ele está presente em ambos os róis, seria contraditório afirmar que os nove dons de I Coríntios 12:8-11 são “espirituais (charisma)” e os dons de Romanos 12:6-8 são “naturais (dorea)”, ou mesmo que em Romanos 12 Paulo tratava de “dons ministeriais”, pois, nesse caso, “profecia” seria apresentado, primeiramente, como “dom natural ou ministerial” em Romanos e, depois, como “dom espiritual” em Coríntios. Não há qualquer possibilidade de “profecia” ser enquadrada como dom natural, nem mesmo ministerial. Por essa razão, todos os demais dons descritos em Romanos 12:6-8 também são, por ocasião lógica, espirituais, sendo “ensinar”, “repartir”, “ministérios”, “exercitar misericórdia” e “presidir” tão charisma quanto “profecia”. Assim, referente à distinção entre dons espirituais e ministeriais, mesmo que se queira fazer uma distinção textual, evidentemente, todo dom ministerial é, por natureza, espiritual (charisma).

Para melhor compreensão sobre o primeiro aspecto acima, a palavra dorea é utilizada no novo testamento onze vezes, nas seguintes passagens: João 4:10 - Atos 2:38 - Atos 8:20 - Atos 10:45 - Atos 11:17 – Romanos 5:15 - Romanos 5:17 – II Coríntios 9:15 - Efésios 3:7 - Efésios 4:7 - Hebreus 6:4, abaixo transcritos:

João 4:10
Jesus respondeu, e disse-lhe: Se tu conheceras o dom de Deus [dorean tou theou], e quem é o que te diz: Dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva.

Atos 2:38
E disse-lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para perdão dos pecados; e recebereis o dom do Espírito Santo [dorean tou hagiou pneumatos];

Atos 8:20
Mas disse-lhe Pedro: O teu dinheiro seja contigo para perdição, pois cuidaste que o dom de Deus [dorean tou theou] se alcança por dinheiro.

Atos 10:45
E os fiéis que eram da circuncisão, todos quantos tinham vindo com Pedro, maravilharam-se de que o dom do Espírito Santo [dorea tou hagiou pneumatos] se derramasse também sobre os gentios.
Atos 11:17
Portanto, se Deus lhes deu o mesmo dom [dorean] que a nós, quando havemos crido no Senhor Jesus Cristo, quem era então eu, para que pudesse resistir a Deus?

Romanos 5:15
Mas não é assim o dom gratuito [charisma] como a ofensa. Porque, se pela ofensa de um morreram muitos, muito mais a graça [charis] de Deus, e o dom [dorea] pela graça [chariti], que é de um só homem, Jesus Cristo, abundou sobre muitos.

Romanos 5:17
Porque, se pela ofensa de um só, a morte reinou por esse, muito mais os que recebem a abundância da graça [charitos], e do dom da justiça [doreas tes dikaiosunes], reinarão em vida por um só, Jesus Cristo.

II Coríntios 9:15
Graças [charis] a Deus, pois, pelo seu dom [dorea] inefável.

Efésios 3:7
Do qual fui feito ministro, pelo dom da graça de Deus [dorean tes charitos tou theou], que me foi dado segundo a operação do seu poder.

Efésios 4:7
Mas a graça [charis] foi dada a cada um de nós segundo a medida do dom de Cristo [doreas tou christou].

Hebreus 6:4
Porque é impossível que os que já uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial [doreas tes epouraniou], e se tornaram participantes do Espírito Santo.

Uma leitura simples é capaz de esclarecer que dorea, em nenhuma dessas passagens bíblicas, foi inserida como um “dom natural”, mas sim como um “presente de Deus”. A salvação, a graça, Jesus e o penhor do Espírito não são dons naturais, são presentes de Deus, advindos de sua imensa graça. É inexplicável a tentativa de mudar-se o sentido da palavra dorea a fim de validar uma interpretação bíblica do assunto.

Por fim, cabe a cada crente descobrir, mediante a oração e o uso de nossos talentos, o dom concedido pelo Espírito Santo, a fim de se utilizar na obra de Deus, para a edificação dos santos e para a glória de Deus, lembrando-se sempre que há um caminho supremo a todos eles, que está ao alcance de todos, o qual Paulo o chama de “o caminho mais excelente” (I Cor 12:31) que é o amor, cuja prática é de obrigação cristã, pois caso contrário, “nada disso me aproveitaria” I Coríntios 13:3b.


Dan Russel de F. Teixeira


Referências

WACHHOLZ, Wilhelm. História e Teologia da Reforma. Editora Sinodal. São Leopoldo/RS. 2010. p. 129.

LOPES, Augustus Nicodemus. Cheios do Espírito. Editora Vida. São Paulo/SP. 2007. p. 56-57.

CARSON, D. A. A manifestação do Espírito Santo: A contemporaneidade dos dons à luz de 1Coríntios 12-14. Vida Nova. 2013.

Bíblia de Estudo Pentecostal. Revista e Corrigida. 1995. p. 1627.

Bíblia de Estudos Palavras Chaves: Hebraico – Grego.CPAD. Rio de Janeiro/RJ. 2011.