A importância
vital da unidade cristã
Referência: Filipenses 2.1-5
1. A
unidade espiritual da igreja é produzida por Deus
A unidade
espiritual da igreja é uma obra exclusiva de Deus. Não podemos produzir
unidade, mas apenas mantê-la. Todos aqueles que crêem em Cristo, em qualquer
lugar, em qualquer tempo fazem parte da família de Deus e estão ligados ao
corpo de Cristo pelo Espírito.
Esta
unidade não é externa, mas interna. Ela não é unidade denominacional, mas
espiritual. Só existe um corpo de Cristo, uma igreja, um rebanho, uma noiva.
Todos aqueles que nasceram de novo e foram lavados no sangue do cordeiro fazem
parte dessa bendita família de Deus.
Esta
unidade é construída sobre o fundamento da verdade (Ef 4.1-6). Por isso, a
tendência ecumênica de unir todas as religiões, afirmando que doutrina divide
enquanto o amor une é uma falácia. Não há unidade cristã fora da verdade.
2. A
unidade espiritual da igreja precisa ser preservada com diligência
William
Barclay diz que o perigo que ameaçava a igreja de Filipos e ainda ameaça todas
as igrejas saudáveis é a desunião. Os negócios internos da igreja não iam tão
bem quanto os negócios externos. Havia alguns transtornos em casa, diz William
Hendriksen. Paulo exorta a igreja de Filipos a tapar as brechas que estavam
comprometendo a unidade da igreja, como já havia exortado a igreja de Éfeso (Ef
4.3).
Paulo
recorre a este tema, depois de tê-lo abordado no capítulo anterior (1.27).
Ninguém pode destruir o fato de que pessoas que creram em Cristo, foram
adotadas na família de Deus, nasceram do Espírito, foram seladas pelo Espírito
e batizadas no corpo de Cristo pelo Espírito são um em Cristo Jesus. Porém,
essas mesmas pessoas podem quebrar essa comunhão como os membros de uma família
que em vez de viver em amor, vivem brigando entre si, deixando de desfrutar a
alegria de uma convivência harmoniosa. Quando os crentes vivem brigando e falando
mal uns dos outros, isso é um espetáculo lamentável e vergonhoso diante do
mundo que desonra a Cristo e a própria igreja.
Paulo faz
uma transição dos inimigos externos (1.28), para os perigos internos (2.1-4).
Ralph Martin diz que esta transição que a palavra grega oun “pois” demarca,
presume que Paulo está deixando a ameaça de um mundo hostil, para tratar de um
problema igualmente ameaçador, o da comunidade dividida. Paulo alerta para o
fato de que uma igreja dividida é uma presa fácil no caso de um ataque frontal
da sociedade externa. Assim, não basta apenas ficar firme contra os perigos que
vêm de fora, é preciso acautelar-se contra o perigo de esboroar-se por causa
das divisões intestinas. Werner de Boor diz que, para Paulo “uma santa e una
igreja” não era apenas um artigo de fé.
A palavra
inicial usada por Paulo é traduzida melhor por “visto que”, ao invés de “se”.
Essa conjunção grega ei “se” implica a inexistência de qualquer dúvida quanto à
realidade destas bênçãos, quer na mente de Paulo, quer na experiência dos
filipenses: poderia ser traduzido assim: “Tão certo quanto…”.
Acompanhemos
o ensino de Paulo sobre esse tema fundamental para a igreja de Cristo em todos
os tempos.
I. OS
ALICERCES DA UNIDADE (2.1)
O
apóstolo Paulo antes de exortar a igreja sobre a questão da unidade cristã dá a
base doutrinária. Há quatro pilares que sustentam a unidade cristã. Esses
pilares não são criados pela igreja, mas são dádivas de Deus à igreja.
Robertson diz que há quatro fundamentos dados por Paulo para justificar seu
apelo à unidade. Ele coloca esses fundamentos em forma cláusulas condicionais,
mas ele assume em cada uma que a condição é verdadeira. Esses pilares já
existem e eles precisam ser o alicerce da unidade.
J. A.
Motyer destaca que podemos ver a obra da própria Trindade na construção da
unidade da igreja. Os crentes estão em Cristo, experimentando a realidade do
amor de Deus, pela ação do Espírito Santo. J. B. Lightfoot diz que o apóstolo
Paulo apela aos filipenses por meio de sua mais profunda experiência como
cristãos para preservarem a paz e a concórdia. Dos quatro fundamentos da
unidade, o primeiro e o terceiro são objetivos (exortação em Cristo e comunhão
do Espírito), os princípios externos do amor e harmonia; enquanto o segundo e o
quarto (consolação de amor e entranhados afetos e misericórdias) são
subjetivos, os sentimentos interiores que nos inspiram.
1.
Exortação em Cristo (2.1)
A palavra
grega paraklesis sugere que há uma obrigação colocada sobre os filipenses,
oriunda diretamente de sua vida comum “em Cristo”, para trabalharem juntos, em
harmonia. Paulo está convidando os filipenses a lembrar-se de seu status de
comunidade amada por Cristo. Bruce Barton diz que todo crente tem recebido
encorajamento, exortação e conforto de Cristo. Essa comum experiência deveria
unir os crentes de Filipos. William Barclay alerta para o fato de que ninguém
pode caminhar desunido com seu semelhante e ao mesmo tempo estar unido a
Cristo. Ninguém pode viver a atmosfera de Cristo e viver ao mesmo tempo odiando
a seus semelhantes.
2.
Consolação de amor (2.1)
Robertson
afirma que a palavra “consolação” aqui deveria ser traduzida como encorajamento
e consolação, pois a idéia é terna persuasão do amor. Aqui é o amor de Cristo
pela igreja que Paulo tem em vista. Ao conclamá-los para que vivam juntos em
harmonia, Paulo apela para os mais altos motivos: o amor que o Senhor da Igreja
nutre por seu povo deve impeli-los a viver dignamente. O amor nos leva a amar
como Cristo nos amou (1Jo 3.16). O amor nos leva a suportar uns aos outros. O
amor nos leva a perdoar uns aos outros. O inferno é a condição eterna dos que
fizeram da relação com Deus e seus semelhantes algo impossível porque
destruíram em suas vidas o amor.
William
Barclay alerta para o fato de que não significa só amar aos que nos amam, aos
que nos agradam ou aos que são dignos de ser amados. Significa uma boa vontade
invencível para aqueles que nos odeiam. É o poder de amar aos que não nos
agradam, é a capacidade semelhante à de Jesus Cristo de amar o que não é amável
nem digno de amor.
3.
Comunhão do Espírito (2.1)
A
participação comum no Espírito, pela qual os crentes são batizados em um só
corpo, deveria determinar a morte de toda desavença e espírito de partidarismo.
F. F. Bruce diz que o Espírito trouxe os cristãos de Filipos à comunhão uns com
os outros. Aquele que os uniu em Cristo, também os uniu uns aos outros. É o
Espírito Santo que produz a nossa comunhão com Deus e a nossa comunhão com o
próximo. É o Espírito que nos une a Deus e ao próximo de tal maneira que todo
aquele que vive em desunião com seus semelhantes dá provas de não possuir o dom
do Espírito. Bruce Barton afirma: “Porque só há um Espírito, há um só corpo (Ef
4.4); facções ou divisões não têm lugar no corpo de Cristo”.
O
Espírito Santo é o princípio unificador na igreja local (1Co 12.4-11). Somente
ele pode dar ordem ao caos e preservar a harmonia no corpo de Cristo. A não ser
que o Espírito Santo reine, haverá na igreja confusão. Sem o Espírito Santo não
há vida nem poder na igreja, diz Robertson. Onde reina o Espírito Santo, existe
amor, porque o amor é fruto do Espírito.
4.
Entranhados afetos e misericórdia (2.1)
A palavra
grega splanchna “afetos” significa literalmente “as entranhas humanas”,
consideradas como a sede da vida emocional (1.8). Enquanto no primeiro capítulo
a palavra está se referindo ao amor de Paulo pelos filipenses, aqui ela se
refere ao amor de Cristo por eles e através deles. Já a palavra grega oiktirmoi
“misericórdias” é a palavra que descreve a emoção humana da piedade terna, ou
simpatia. A irmandade em uma igreja não se limita a “sentimentos” nem se resume
em atividades de ajuda e frias ações. Certamente nossas “entranhas” precisam
ser movidas, e as aflições do irmão precisam despertar em nós uma viva
compaixão.
Quando o
Espírito Santo trabalha na vida do crente, o fruto do Espírito é produzido (Gl
5.22,23). Paulo destaca dois desses frutos que acentuam o verdadeiro cuidado de
um para com o outro, o que pavimenta a unidade entre os crentes. “Afeto” refere-se
à sensibilidade para com as necessidades e sentimentos dos outros, enquanto
“compaixão” significa o sentimento de dor que alguém sente ao ver o outro
sofrer e o desejo de aliviá-lo desse sofrimento. Tal preocupação fortalece a
unidade entre os crentes. Toda desarmonia na igreja de Deus é falta dos
entranhados afetos. É ausência de misericórdia.
II. OS
PERIGOS CONTRA A UNIDADE (2.3,4)
O
apóstolo Paulo já havia mencionado o exemplo negativo de alguns crentes de Roma
que estavam trabalhando com a motivação errada (1.15,17). Esse comportamento
fere a comunhão entre os irmãos e perturba a unidade da igreja. Agora, Paulo
fala sobre dois perigos que conspiram contra a unidade da igreja.
1.
Partidarismo (2.3)
A igreja
de Filipos tinha muitas virtudes, a ponto de Paulo considerá-la sua alegria e
coroa (4.1). Mas esta igreja estava ameaçada por alguns sérios perigos na área
da unidade. Havia tensões dentro da igreja. A comunhão estava sendo atacada. A
palavra grega eritheia traduzida por “partidarismo” é o resultado do egoísmo.
Depois de Paulo mencionar a atitude mesquinha de alguns crentes de Roma que,
movidos por inveja pregavam a Cristo para despertar nele ciúmes, pensando que o
seu trabalho apostólico era uma espécie de campeonato em busca de prestígio, volta,
agora, suas baterias para apontar os perigos que estavam afetando, também, a
unidade na igreja de Filipos.
Em
primeiro lugar, o perigo de trabalhar sem unidade (1.27). Nada debilita mais a
unidade do que os crentes estarem engajados no serviço de Deus sem unidade. A
obra de Deus não pode avançar quando cada um puxa para um lado, quando cada um
busca mais seus interesses do que a glória de Cristo. Na igreja de Filipos
havia ações desordenadas. Eles estavam todos lutando pelo Evangelho, mas não
juntos.
Em
segundo lugar, o perigo de líderes buscarem seus próprios interesses (2.21).
Paulo ao enviar Timóteo à igreja de Filipos e dar bom testemunho acerca dele,
denuncia, ao mesmo tempo, alguns líderes que buscavam seus próprios interesses.
Esses líderes eram amantes dos holofotes; eles não buscavam a glória de Deus
nem a edificação da igreja, mas a construção de monumentos aos seus próprios
nomes.
Em
terceiro lugar, o perigo de falsos mestres se infiltrando na igreja (3.2). Os
falsos mestres, os maus obreiros e a heresia são sempre uma ameaça à igreja. Os
lobos sempre buscarão uma brecha para entrarem no meio do rebanho (At 20.29).
Paulo está alertando a igreja de Filipos sobre os judaizantes que tentavam
desacreditar seu apostolado, ensinando que os gentios precisavam ser
circuncidados caso desejassem ser salvos. Assim, eles negavam a suficiência da
fé em Cristo e acrescentavam ritos judaicos como condição indispensável para a
salvação.
Em quarto
lugar, o perigo do mundanismo na igreja (3.17-19). A unidade da igreja de
Filipos estava sendo ameaçada por homens mundanos, libertinos e imorais. Essas
pessoas fizeram Paulo sofrer de tal modo, que o levaram às lágrimas (3.18).
Paulo os chama de inimigos da cruz de Cristo (3.18). Essas pessoas eram
mundanas, pois só se preocupavam com as coisas terrenas (3.19). Eram comilões,
beberrões e imorais, com uma visão muito liberal da fé cristã, do tipo que está
sempre dizendo: “isso não é pecado, não tem problema”. Em vez de a igreja
seguir a vida escandalosa desses libertinos, deveria imitar o seu exemplo
(2.17).
Em quinto
lugar, o perigo dos crentes viverem em conflito dentro da igreja (4.2). Aqui o
apóstolo está trabalhando com a questão do conflito entre lideranças da igreja
local, pessoas que disputam entre si a atenção e os espaços de atuação na
igreja. Paulo Lockmann comentando este texto diz que quando o trabalho era
dirigido pela família de Evódia, o pessoal de Síntique não participava, e
quando era promovido por Síntique quem não participava era o pessoal de Evódia.
2.
Vanglória ou egoísmo (2.3)
Vanglória
é buscar glória para si mesmo. A palavra grega kenodoxia traduzida por
“vanglória” só aparece aqui em todo o Novo Testamento. Ela denota uma
inclinação orgulhosa que busca tomar o lugar de Deus, e a estabelecer um status
auto-assertivo que rapidamente induz ao desprezo do próximo (Gl 5.26). A
vanglória destrói a verdadeira vida comunitária. Paulo colocou seu “dedo
investigativo” bem na ferida dos filipenses. Os membros da igreja de Filipos
estavam causando discórdia por causa de suas atitudes ou ações. Eles desejavam
reconhecimento ou distinção, não por puros motivos, mas meramente por ambição
pessoal. Eles estavam criando partidos baseados em prestígio pessoal, ao mesmo
tempo em que desprezavam os outros.
III. O
IMPERATIVO DA UNIDADE (2.2)
O
apóstolo Paulo está preso, algemado, na ante-sala do martírio, mas sua atenção
não está voltada para si mesmo. Havia alegria no coração do apóstolo (4.4,10),
mas sua medida ainda não estava cheia. Um grau mais elevado de unidade, de humildade
e de solicitude em família pode completar o que ainda falta no cálice da
alegria de Paulo. Seu principal anseio não era a rápida libertação da prisão,
mas o progresso espiritual dos filipenses. Sua alegria, não vem de suas
condições pessoais, mas da condição da igreja de Deus. Mesmo preso Paulo diz
que a igreja de Filipos era sua alegria e coroa (4.1). Suas orações em prol dos
cristãos filipenses eram orações alegres (1.4). Mas, agora, o apóstolo deseja
que o cálice da sua alegria transborde e por isso ordena: “Completai a minha
alegria, de modo que penseis a mesma cousa, tenhais o mesmo amor, sejais unidos
de alma, tendo o mesmo sentimento” (2.2). Paulo não pode estar alegre enquanto
o espírito de facção existir nessa generosa igreja de Filipos.
F. F.
Bruce diz que Paulo exorta, na verdade, para que tenham unanimidade de coração.
Não se trata da unanimidade formal que se consegue manter mediante o exercício
do poder de veto; trata-se daquela unanimidade sincera de propósitos, pela qual
ninguém deseja impor um veto sobre as pessoas.
Aquela
mesma igreja que estava comprometida com Paulo no apoio missionário, dando-lhe
conforto e sustento financeiro, estava sendo ameaçada por divisões internas e
isso estava toldando a alegria no coração do velho apóstolo.
Como a igreja poderia completar a alegria de Paulo?
1. Demonstrando unidade de pensamento (2.2)
Como a igreja poderia completar a alegria de Paulo?
1. Demonstrando unidade de pensamento (2.2)
A unidade
de pensamento não é uma coisa fácil de alcançar, especialmente onde as pessoas
têm uma mente ativa e um espírito independente. O verbo grego phronein usado
aqui para definir “o pensar a mesma coisa” é muito importante nesta epístola,
uma vez que aparece nesta carta dez vezes, enquanto aparece apenas mais treze
vezes em todas as demais epístolas. Werner de Boor corretamente afirma que
phronein não tem em vista o “pensamento” teórico do teólogo, mas o pensar
prático, subordinado ao querer. Trata-se do phronein de Jesus Cristo, que neste
caso não é o raciocínio doutrinário, com o qual o eterno Filho de Deus sem
dúvida poderia ter apresentado uma imagem condizente de todas as coisas. Aqui
se trata do “pensamento” que conduziu o Filho de Deus do trono da glória para a
vergonha da morte na cruz! Se todos “pensarem” da maneira como Jesus Cristo
também pensou, como ele morreu por pecadores, não poderão se separar; hão de
apegar-se aos irmãos. Nessa mesma linha de pensamento Moule diz que a palavra
phronein traduzida aqui por “mente” denota não uma capacidade intelectual, mas
uma ação e uma atitude moral.
Bruce
Barton está correto quando diz que “ter uma só mente” não significa que os
crentes têm que concordar em tudo; em vez disso, cada crente deve ter a mesma
atitude de Cristo, que Paulo descreve em Filipenses 2.5-11.
2.
Demonstrando unidade nos relacionamentos (2.2)
Os irmãos
da igreja de Filipos precisam ter o mesmo amor uns pelos outros, igual ao que
Cristo tem por eles. Bruce Barton diz que o amor de Cristo o trouxe do céu para
a humilde condição da natureza humana, para morrer na cruz em favor dos
pecadores. Muito embora os crentes não podem fazer o que Cristo fez, eles podem
seguir seu exemplo, quando expressam o mesmo amor na maneira de lidar uns com
os outros.
3.
Demonstrando unidade espiritual (2.2)
A igreja precisa ser unida de alma. Jesus orou para que todos aqueles que crêem possam ser um como ele e o Pai são um (Jo 17.22-24). Robertson diz que essa frase significa dois corações batendo como se fosse um só. Na igreja de Deus não há espaço para disputas pessoais. A igreja não é um concurso de projeção pessoal nem um campeonato de desempenhos pessoais. A igreja é um corpo onde cada membro coopera com o outro, visando a edificação de todos.
A igreja precisa ser unida de alma. Jesus orou para que todos aqueles que crêem possam ser um como ele e o Pai são um (Jo 17.22-24). Robertson diz que essa frase significa dois corações batendo como se fosse um só. Na igreja de Deus não há espaço para disputas pessoais. A igreja não é um concurso de projeção pessoal nem um campeonato de desempenhos pessoais. A igreja é um corpo onde cada membro coopera com o outro, visando a edificação de todos.
4.
Demonstrando unidade de sentimento (2.2)
A igreja
precisa ser ter o mesmo sentimento. A igreja é como um coro que deve cantar no
mesmo tom. Os crentes não são competidores, mas cooperadores. Eles não são
rivais, mas parceiros. Eles não estão lutando por causas pessoais, mas todos
buscando a glória de Deus. Na igreja de Deus não devem existir disputas
políticas, briga por cargos, ciúmes e invejas. O espírito de Diótrefes que
buscava primazia e desprezava os outros, não deve ser cultivado na igreja de
Deus (3Jo 9-11).
IV. A
VIRTUDE QUE PROMOVE A UNIDADE (2.3-5)
A
humildade é a virtude que promove a unidade. A humildade é o remédio para os
males que atacam a unidade da igreja. A palavra grega tapeinophrosyne é um
termo cunhado pelo cristianismo. Ralph Martin diz que “humildade” era uma
expressão de opróbrio no pensamento clássico grego, tendo conotações de
“servilismo”, como nas atitudes de um homem vil, ou de um escravo. Lightfoot
diz que quase sempre entre os escritores gregos “humildade” tem um significado
negativo. Entre o povo de Deus, a humildade é um imperativo, pois “Deus
escarnece dos escarnecedores, mas dá graça aos humildes” (Pv 3.34). Tiago diz
que Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes (Tg 4.6) e o apóstolo
Pedro ordena: “Humilhai-vos, portanto, sob a poderosa mão de Deus, para que
ele, em tempo oportuno, vos exalte” (1Pe 5.5). A humildade deve ser a marca do
cristão, pois seu senhor e mestre foi “manso e humilde de coração” (Mt 11.29).
Os discípulos de Cristo demoraram entender essa lição e muitas vezes discutiram
quem devia ocupar a primazia entre eles. Nessas ocasiões Jesus lhes dizia que
maior é o que serve e que ele mesmo veio não para ser servido, mas para servir
(Mc 10.45).
1. O que
é humildade? (2.3)
A
humildade provém do conhecimento de Deus e de um correto conhecimento de si
mesmo. Enquanto a ambição e o preconceito arruínam a unidade da igreja, a
genuína humildade a edifica. Ser humilde envolve ter uma correta perspectiva
sobre nós mesmos em relação a Deus (Rm 12.3), que por sua vez nos coloca numa
correta perspectiva em relação ao próximo. O apóstolo Paulo deu o seu próprio
testemunho em suas cartas. Durante a sua terceira viagem missionária se
qualificou de “o menor dos apóstolos” (1Co 15.9), durante sua primeira prisão
em Roma se intitulou de “o menor dos menores de todos os santos” (Ef 3.8), e um
pouco mais tarde, durante o período que se estendeu da primeira à segunda
prisão em Roma, levou essas descrições humildes de sua pessoa ao clímax, designando-se
de “o principal dos pecadores” (1Tm 1.15). Jamais o orgulho prevalece no
coração de alguém que conhece a Deus e a si mesmo. F. F. Bruce, citando James
Montgomery lança luz sobre o que é humildade:
O pássaro
que alça as asas nos céus,
Constrói seu ninho lá em baixo, na terra.
E o que trina maviosamente,
Canta de noite quando tudo repousa.
Na cotovia e no rouxinol vemos
Quanta honra cabe à humildade.
Constrói seu ninho lá em baixo, na terra.
E o que trina maviosamente,
Canta de noite quando tudo repousa.
Na cotovia e no rouxinol vemos
Quanta honra cabe à humildade.
O santo
que usa a coroa mais brilhante do céu,
Curva-se em humilde adoração.
O peso da glória faz que se prostre,
Quanto mais se prostra mais sua alma ascende;
O escabelo da humildade deve estar
Bem perto do trono de Deus.
Curva-se em humilde adoração.
O peso da glória faz que se prostre,
Quanto mais se prostra mais sua alma ascende;
O escabelo da humildade deve estar
Bem perto do trono de Deus.
2. Como a
humildade se manifesta? (2.3,4)
O
apóstolo Paulo menciona duas manifestações da humildade.
Em
primeiro lugar, a humildade olha para o outro com honra (2.3). No capítulo
primeiro, Paulo colocou Cristo em primeiro lugar (1.21). Agora, coloca o outro
acima do eu (2.3). Uma pessoa humilde não tem sede de fama, projeção e
aplausos. Ela não se embriaga com o poder. Ela não busca os holofotes do palco
nem corre atrás das luzes da ribalta. Uma pessoa humilde não canta “quão grande
és tu” diante do espelho. Werner de Boor diz que uma pessoa humilde tem prazer
de realizar o serviço pouco aparente, o trabalho que permanece nos bastidores,
a obra insignificante, deixando com alegria aos outros aquilo que parece mais
importante e obtém maior reconhecimento.
Em
segundo lugar, a humildade busca o interesse do outro com solicitude (2.4). A
igreja de Filipos era multirracial: Lídia era uma judia rica, a jovem liberta
era uma escrava grega e o carcereiro era um oficial romano da classe média.
Nessas condições não era fácil manter a unidade da igreja. Ter interesse em
proteger os interesses alheios, porém, faz parte dos alicerces da ética cristã.
No mundo cada um cuida primeiro de si, pensa somente em si e tem o olhar atento
apenas para os próprios interesses. Os interesses dos outros estão fora de seu
verdadeiro campo de visão. Por isso tampouco existe no mundo verdadeira
comunhão, mas somente o medo recíproco e a ciumenta autodefesa contra o outro.
Na irmandade da igreja de Jesus pode e deve ser diferente, diz Werner de Boor.
É
importante ressaltar que Paulo não exige que eu negligencie as minhas coisas e
somente me engaje em favor dos outros. Porém, Paulo espera que meu olhar de
amor e preocupação também caia sobre as necessidades, dificuldades e aflições
do irmão, e presume que ainda restem tempo, energia e capacidade em quantidade
suficiente.
3. O
supremo exemplo da humildade (2.5)
Neste
capítulo dois, Paulo cita quatro exemplos de humildade, ou seja, colocar o
“outro” na frente do “eu” (2.5; 2.17; 2.20; 2.30). Porém, o argumento decisivo
de Paulo é o exemplo de Cristo (2.5). F. F. Bruce diz que o exemplo de Cristo é
sempre o argumento supremo de Paulo na exortação ética, principalmente quando
trata do interesse altruísta pelo bem-estar do próximo. Se o exemplo de Cristo
deve ser seguido, é melhor, então, manter maior interesse pelos direitos dos
outros e pelos nossos deveres, do que cuidar principalmente de nossos direitos
e dos deveres dos outros.
O texto
que registra a encarnação, esvaziamento, humilhação, obediência, morte e
exaltação de Cristo não é uma peça doutrinária escrita por um teológico de
gabinete que está traçando reluzentes verdades doutrinárias contra o nevoeiro
denso das heresias, mas foram escritas por um homem que, com humildade e amor
lutava pela verdadeira concórdia de seus irmãos. Essas frases, com todo o seu
teor dogmático são parte dessa luta. A leitura correta deste magno texto
cristológico não é apenas aquela que trata da humilhação e exaltação do Filho
de Deus, mas a que abala nosso coração egoísta e vaidoso por meio da trajetória
seguida por Jesus.
Rev.
Hernandes Dias Lopes
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